O programa Escolas Transformadoras é uma iniciativa global que integra uma rede formada por mais de 280 escolas de 34 países, sendo 18 brasileiras.
O programa Escolas Transformadoras é composto por uma comunidade formada por pessoas de diversas áreas, que possuem um interesse comum: mudar a conversa sobre educação. Integram esse grupo equipes de escolas, jornalistas, empresários, professores universitários, representantes do poder público e do terceiro setor e artistas que, por meio de suas ações, contribuem para a construção de um novo marco para a educação brasileira.
O programa Escolas Transformadoras é uma iniciativa da Ashoka, organização global que reúne empreendedores sociais de diversas partes do mundo.
Fruto da crença de que todos podem ser transformadores da sociedade, o programa enxerga a escola como espaço privilegiado para proporcionar experiências capazes de formar sujeitos com senso de responsabilidade pelo mundo: crianças e jovens aptos a assumir papel ativo diante das mudanças necessárias, em diferentes realidades sociais e amparados por valores e ferramentas como a empatia, o trabalho em equipe, a criatividade e o protagonismo.
O programa teve início nos Estados Unidos, em 2009, e de lá para cá espalhou-se por 34 países. Hoje conta com uma rede formada por mais de 280 escolas, sendo 21 brasileiras.
No Brasil, a iniciativa foi lançada em setembro de 2015 em uma correalização com o Alana, organização sem fins lucrativos que aposta em projetos que buscam a garantia de condições para a vivência plena da infância.
Após um criterioso processo de reconhecimento, as escolas são convidadas a engajar-se em uma comunidade com diversos profissionais que comungam da visão de que todos podem ser transformadores. Fazem parte desse grupo jornalistas, professores universitários, representantes do poder público e do terceiro setor, especialistas e artistas.
Essa comunidade ativadora entende a criança e o jovem sob uma perspectiva integral do desenvolvimento, em que corpo, emoção e razão não se separam e todos são essenciais para a constituição de pessoas livres, independentes e capazes de se relacionar e agir sobre o mundo de maneira mais empática. As experiências e trajetórias das escolas e dos demais integrantes da comunidade do programa Escolas Transformadoras inspiram e ajudam a ampliar a demanda social por esse tipo de educação.
Junto a essa comunidade, a Ashoka e o Alana aceitaram o desafio de compartilhar uma mensagem comum: a educação em diversos cantos do país e do mundo está mudando. Vamos todos fazer parte desse grande e necessário movimento.
Mais do que criar ou replicar um novo programa ou currículo, estamos falando de lutar por uma mudança de mentalidade e visão sobre a educação. De criar e promover, juntos, um novo marco de referência para a educação e a vida das pessoas em sociedade.
Em 2018 a Escola Pluricultural Odé Kayodê é reconhecida como Escola Transformadora após um criterioso processo de análise e acompanhamento.
“A Escola Pluricultural Odé Kayodê não surgiu porque faltavam escolas em Goiás. Mas porque faltava essa.” A frase perpassa pelas vozes de diferentes educadoras e educadores que circulam diariamente pelos caminhos de pedras, árvores, esculturas e símbolos indígenas e de religiões afro-brasileiras presentes no espaço onde está localizado a escola, no município de Goiás, a 150 quilômetros da capital Goiânia (GO).
Embora tenha sido inaugurada oficialmente em 2004, a Odé Kayodê é resultado de um encontro de muitas pessoas que há muito tempo já vinham transformando vidas e realidades por meio do Espaço Cultural Vila Esperança. O terreno onde fica o Espaço Cultural era, até a década de 1990, um local de depósito de lixo, às margens do rio Vermelho, que recebeu os cuidados e o olhar de um dos fundadores do local, o educador Robson Max. Com poucos recursos, mas muitas ideias e força de vontade, ele se uniu a um grupo de artistas e educadores, que foi tirando, um a um, os lixos jogados ali. A partir dessa ação inicial, a construção física e filosófica do espaço foi “tomando pé e posse” – como Robson explica. Pouco tempo depois, a Vila Esperança dispunha de uma área de teatro e uma arena de circo, e já era tida, na região, como um local de difusão de culturas, valorizando, especialmente, os povos originários e invisibilizados do país – os indígenas, africanos e afro-brasileiros. O espaço é uma referência social, humana, artística e cultural para a comunidade e, ao longo do ano, oferece uma programação de eventos abertos à cidade, com atividades educativas e artísticas como artes plásticas, música, canto e dançaterapia.
Por anos, foi desejo dos educadores dali entrar e permanecer em redes públicas de ensino. Até que, em 2004, foi inaugurada a Escola Pluricultural Odé Kayodê, dentro do Vila Esperança, que atende, atualmente, 50 estudantes de Educação Infantil e Ensino Fundamental I. Um projeto que, como conta a diretora, Rosângela Magda, muitos dos educadores “foram ajudando a nascer”. A concepção de educação que prevalece é a de que a aprendizagem não se dá fora de um contexto real da sociedade. Busca-se educar não para que os indivíduos se adaptem à realidade, mas para que nela atuem politicamente, provocando grandes transformações sociais. O conhecimento, para a escola, não é algo dado, tampouco transmitido, mas sim uma busca, uma constante construção. O nome da escola diz muito do que ela acredita para seus educandos, professores e comunidade: na língua iorubá, “Odé” significa caçador – não caçador de animais, mas caçador de si mesmo – e “kayodê”, alegria. A escola apresenta-se, então, como uma “caçadora de alegria”, pressuposto filosófico que sustenta sua concepção e prática pedagógica.
1. Por Que A Escola Pluricultural Odé Kayodê É Uma Escola Transformadora?
Apoiada na compreensão de que a escola pode e deve despertar encantamento, a Escola Pluricultural Odé Kayodê redefine os conceitos sobre o que é educação. Para ela, a escola tem um importante papel social e educar é sinônimo de ter entusiasmo em ensinar e em aprender. Educar é, também, compreender que o conteúdo deve ganhar sentido para a vida, contribuindo para a formação humanizadora e o despertar do protagonismo em prol de uma transformação da realidade. É acreditar que a educação se dá pela vivência, pelos sentidos, pela valorização da cultura e da ancestralidade. A cultura, aqui, vista como potência, vitalidade e alicerce que atravessa todos as experiências vividas na escola.
Nessa escola, a educação não é vista somente no sentido restrito, curricular, mas também a partir do entendimento de que ela precisa dar condições para os estudantes lerem o mundo de forma crítica e criativa. “Educar para quê? Para provas e mais provas? Não! Educar para a vida, para o respeito ao outro e a si mesmo, observando nossas raízes e nos fortalecendo para o combate, por um modo de viver efetivamente transformador da minha realidade e a dos que me cercam”, defende o professor Fernando Cássio Serafim, integrante da equipe da escola. Para tanto, busca-se respeitar a integralidade e os caminhos dos estudantes, em um exercício de respeito, paciência e adequação aos tempos de cada um, buscando sempre o equilíbrio para o reconhecimento e a conexão com os sonhos e perspectivas do outro.
A criança é central no processo de ensino e aprendizagem: suas necessidades, curiosidades e histórias de vida são consideradas pontos de partida para o ensino de novos conteúdos e na investigação e assimilação de conceitos. No modo de realizar as atividades propostas, a criança participa de todos os processos, desde a construção de um projeto até a realização e a avaliação dos resultados. As crianças são ouvidas e, suas opiniões, valorizadas. Uma das ações realizadas por elas, a título de exemplo, é a Rádio da Vila, na qual organizam e constroem o conteúdo de um programa diário que é distribuído à cidade. A atividade, mediada por um educador, foi vencedora do 2º Prêmio Nacional de Projetos com Participação Infantil CECIP, no Rio de Janeiro.
O espaço físico da escola foi construído e pensado como um elemento que promove o desenvolvimento integral das crianças, propiciando o protagonismo e o diálogo, num processo de exercício da cidadania. A fim de estimular a troca de diferentes pontos de vista, os educadores e educandos dão início aos dias fazendo uma grande roda – que é tida como um princípio e uma metodologia escolar. Na roda todos se veem, todos estão no mesmo patamar e na “primeira fila”. Todos têm os mesmos direitos e os mesmos deveres. Em roda há conversas, se dança, se brinca, se aprende. “Reconhecemos a importância da roda cotidianamente, ela nos possibilita ocupar o nosso lugar, a nos reconhecer, a nos apropriar da nossa identidade e nos educa com equidade a vivenciar as mesmas oportunidades”, explicam os educadores. As atividades extra-classe também têm grande importância na escola, pois consistem na vivência com o corpo inteiro de conteúdos trabalhados em sala de aula. Tais atividades não concorrem com as atividades regulares, mas complementam-nas, compondo o currículo da escola e oportunizando a vivência, a experimentação e a realização concreta do desenvolvimento da expressão corporal e percepção musical e rítmica.
As turmas na Odé Kayodê são divididas em quatro agrupamentos: Educação Infantil; 1º e 2º ano; 3º ano; e 4º e 5º ano. Como há um pequeno número de crianças por agrupamento, a atenção individualizada é quase permanente. Quando necessitam de apoio específico, a família é comunicada e as crianças são convidadas a participar de momentos extra-classe pontuais e por prazos determinados, de acordo com as dificuldades de aprendizagem manifestadas. O modo de ser coletivo, as rodas de socialização e a organização dialógica das salas de aula promovem a interação, possibilitando que o estudante aprenda com as diferentes ideias e linguagens do outro.
2. Influência
O olhar que a Escola Pluricultural Odé Kayodê tem sobre educação também passa pela ideia da “pedagogia da festa”, que a desafia na possibilidade de buscar pessoas, tempos e espaços a fim de fazer diferença e transformação a partir de situações postas. São encontros que visam o vínculo afetivo estabelecido em partilhas e festas, ultrapassam momentos burocráticos e buscam o diferente. Entre as celebrações promovidas para os educandos, educadores, famílias e comunidade está a Porancê Poranga que significa “reunião para dançar bonito” – aula de ritmo e percussão que parte da concepção de que somos sons únicos no universo, mas que só conseguimos nos afinar em roda coletiva –, e a Festa da Terra, na qual os familiares se organizam para a realização conjunta de uma festa na rua, englobando os aspectos de tradições populares, cultura rural e agroecologia.
A escola recebe regularmente visitas guiadas de grupos e escolas. Estabeleceu, há alguns anos, uma relação próxima com estudantes universitários e pesquisadores de instituições como Universidade Federal de Goiás, Universidade Estadual de Goiás e Instituto Federal de Goiás, especialmente os que buscam referências para o trabalho com a Lei 10.639/03, que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana, ressaltando a importância da cultura negra na formação da sociedade, e a Lei 11.645/08, que diz respeito à inclusão da história e cultura afro-brasileira e indígena no currículo escolar. As parcerias firmadas com universidades da região têm possibilitado a efetivação de projetos em comum, como as visitas e cursos de extensão em disciplinas como História, Pedagogia, Filosofia e Ecologia, e grupos de estudo de educação étnico-racial.
A Odé Kayodê é também uma referência cultural por ter contribuído no reconhecimento da cidade de Goiás como patrimônio histórico da humanidade pela UNESCO.
3. As Práticas E As Competências Transformadoras
A fala e a escuta das crianças; as brincadeiras e os jogos como vivências imprescindíveis da infância; o corpo como ponto de partida para a compreensão do mundo; entre outras percepções sobre a formação dos sujeitos, são reveladas como elementos que estruturam o cotidiano da Escola Pluricultural Odé Kayodê. Como lembra a coordenadora pedagógica Emicléia Alves Pinheiro, “é na rotina que temos a possibilidade de fazer diferente.”
No dia a dia, o trabalho em equipe permeia as ações e práticas de ensino e aprendizagem. Não há um único educador responsável exclusivamente por um agrupamento; todas as crianças são de responsabilidade conjunta do grupo docente. Ser referência de uma turma, nesse caso, tem a ver com a organização e o acompanhamento individual dos processos de aprendizagem e com a sua documentação. Sendo assim, as crianças respeitam e estabelecem vínculo de segurança e disponibilidade em aprender com todos. Essa responsabilidade compartilhada também se apresenta em outros contextos, como, por exemplo, nos momentos de refeição, onde todos limpam e auxiliam na cozinha.
O processo de desenvolvimento da empatia se dá a partir de situações conflituosas, sempre considerando o ponto de vista do outro para ampliar a compreensão dos acontecimentos. A escola vê a importância de entender a origem dos conflitos, pois isso facilita seu gerenciamento e ajuda no entendimento das razões que levaram o estudante a agir de determinada maneira. São discutidos em grupo desde as problemáticas vivenciadas no cotidiano da sala de aula, até assuntos mais gerais, ligados à política, distribuição de renda, relação com o meio ambiente, entre outros. Essa troca de opiniões e experiências são momentos determinantes para se desenvolver a empatia, promover reflexões e melhorar a relação entre educandos e educadores.
FONTE: http://escolastransformadoras.com.br
Sobre a Ashoka
A Ashoka é uma organização social global fundada em 1981 e congrega mais de 3 mil empreendedores sociais em 84 países. Busca colaborar na construção de um mundo em que Todos Podem Ser Transformadores (Everyone a Changemaker) onde qualquer pessoa pode desenvolver e aplicar as habilidades necessárias para solucionar os principais problemas sociais que enfrentamos hoje.
Sobre o Alana
O Alana é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, que aposta em programas que buscam a garantia de condições para a vivência plena da infância. Criado em 1994, o Alana é mantido pelos rendimentos de um fundo patrimonial desde 2013. Tem como missão “honrar a criança”.